terça-feira, 28 de julho de 2009

A cidade que vibra


Não é tão difícil entender porque algumas pessoas simplesmente não suportam São Paulo. A cidade é cinza durante boa parte do tempo, o trânsito é caótico, o frio é intenso entre os meses de maio e julho e a poluição afeta a saúde de alguns. Defeitos tão perceptíveis que terminam por lançar outro questionamento à luz: por que, então, eu gosto tanto de São Paulo? Como pude perceber, logo que cheguei nesta movimentada metrópole, é preciso aprender a gostar de São Paulo. Tudo depende também dos gostos pessoais e é isso que explica a minha paixão pela Paulicéia. Primeiro, não posso me considerar um amante da praia, fator crítico para muitos baianos que vêm morar aqui. Adoro ver o mar e gosto de veranear em locais com praias, mas de fato ela sempre exerceu pouca influência na minha rotina. Sair do conforto da minha casa, atravessar a cidade, enfrentar o trânsito e a farofa para tomar um banho de mar na Praia de Aleluia? Bem, não está entre os meus programas favoritos. Troco fácil por uma barraca (de praia ou não) que tenha uma cerveja bem gelada, caranguejos graúdos e uma boa lambreta. Disso sim sinto saudade.


Segundo fator: o trânsito. Desse não há como fugir em determinados momentos, mas existem maneiras de atenuar o desconforto. Morar perto do trabalho é a solução ideal e isso eu tratei de priorizar logo que cheguei. Frio? Adoro, as pessoas ficam mais elegantes e o abominável suor deixa de existir. Está frio demais? Agasalhe-se. Poluição: esse é o mais complicado dos fatores, mas o nosso organismo tem o notável poder de se adaptar aos ambientes. Ao chegar aqui, tive reações na pele e nos olhos. Quase cinco meses depois, isso já é coisa do passado.
O que mais me encanta em São Paulo é a sua característica de cidade do mundo, onde tudo se encontra e onde as opções nunca cessam. Há beleza em sair às 4 da manhã e encontrar movimento intenso de carros nas ruas, bares cheios e lanchonetes frequentadas por ávidos baladeiros esfomeados? Há sim, claro, ainda mais quando grande parte das cidades brasileiras não sabem viver a noite a contento. Como notívago, nada pode ser mais prazeroso. A vida cultural intensa, com praticamente todos os shows internacionais passando por aqui e um extenso leque de peças de teatro e exposições, é um prato cheio para qualquer amante das artes. Para quem gosta de comer bem e ainda curte uma novidade como, sei lá, um restaurante de comida contemporânea romena, aqui é o lugar. Basta fuçar; aqui se acha tudo.

Isso sem contar as afinidades que não se explicam de modo racional, como o sentimento de pertencimento a um local. Aqui me sinto bem, me identifico com as pessoas e com o bairro onde moro, curto as contradições e até o caos urbano, que faz com que eu me sinta vivo. Por outros diversos motivos, o mesmo sentimento existe em relação a Salvador, o que me faz um cidadão feliz em qualquer um das duas metrópoles. Imagino que deve haver uma identificação dos baianos com essa cidade, o que a princípio parece meio estranho, já que temos referências tão distintas. Mas se você pensar, não à toa, foi um baiano que escreveu a mais sincera canção sobre essa selva de pedra: Caetano e a sua - batida, porém inesquecível - Sampa.

domingo, 26 de julho de 2009

Música para os meus ouvidos


Em algumas cidades, você chega e a empatia pulula logo de cara. Comigo, foi assim com a genial Londres, com a belíssima Paris, com a vibrante Barcelona e, mais recentemente, com a misteriosa Cuzco. A cidade de New Orleans acaba de entrar nesta lista, muito por causa da música, outro tanto por causa da comida e uma pitada por conta do sofrimento recente provocado pelo destruidor Katrina. Ver a garra e a força de um povo que se reconstrói é deveras fascinante. Boa dose dessa imediata simpatia se deve também à deliciosa constatação de que essa é uma cidade "esculhambada" frente ao por vezes careta "american way of life". Algo lembra o Brasil, mais especificamente a Bahia, com o que há de quente no povo negro e no caldeirão de influências que passa também pela França, Grécia e Espanha (no caso deles).


A recepção de uma cidade conta muito nas nossas preferências, não é clichê dizer que a primeira impressão é a que fica. Dias chuvosos ou quentes demais, povo antipático ou alheio, poucas opções de lazer. Tudo isso influencia e explica porque uns adoram e outros odeiam determinados destinos turísticos. New Orleans, na beleza de uma América distinta, sabe receber a quem a ela se entrega. Tem algo mais regozijador do que chegar em um hotel em que o lounge está banhado por um discreto som de jazz e, surpresa, o quarto também o recebe com um som ligado numa levada de primeira linha? Bem, welcome to New Orleans. Falta é coragem de desligar o CD player, resta mesmo é a opção de se permitir o encontro com Morfeu ao som de uma bela música para os meus ouvidos. Como numa peça que o destino nos prega, eu mereci somente um dia e meio nesta cidade. Resta aguardar para que uma ida - quem sabe, de férias - compense tamanha rapidez.

Aos beijos*


O lado Sá da minha família sempre foi muito chegado aos beijos. Quase tudo que aprendi sobre carinho foi com eles. Em festas como a que ocorreu no final de junho, aniversário de meu irmão, esse amor fraternal que os mais de 70 parentes diretos sentem um pelo outro fica ainda mais exarcebado. Quando você mora fora de Salvador então, a coisa aumenta exponencialmente. Costumamos dizer que se a família Sá (ou Bala, como somos conhecidos) está presente, a animação da festa é garantida. Somos sempre os últimos a deixarem a pista, os conhecidos "caroços".


Hoje, são quatro gerações convivendo, é bom lembrar. Do alto dos seus 97 anos, Nairzinha Bala é o sol que nos norteia. Exemplo de mulher forte, arquétipo da matriarca das famílias tradicionais, minha avó é uma líder que soube manter a família sempre unida. Brigas? Poucas e sempre resolvidas na hora. Não à toa, o meu jeito "pá pum" de resolver as coisas e a minha sinceridade às vezes desmedida veio dessa família Bala.


Triste aquele que não tem família. a minha não largo por nada. Devo minha educação a ela. Aprendi a beber, a conversar, a ser versátil e a me adaptar bem a diferentes públicos com os Balas. Devo o respeito, o amor ao próximo, a vontade de ganhar o mundo à minha família. Devo a ansiedade, o anseio de estar em todos os lugares ao mesmo tempo e o incansável desejo de farrear a cada um deles. Devo a minha cultura. Sou o que sou devido a ela. Sou a família.


* Esse texto é dedicado ao saudoso Tio Waldir

Múltiplo Caê


Caetano Veloso envelhece bem, como poucos. Chico Buarque praticamente abandonou a música, tornou-se um compositor bissexto que hoje responde mais ao chamado de escritor. Ainda assim, quando lança um disco, parece preguiçoso e desmotivado. Gilberto Gil ainda tem gás para queimar, especialmente depois que largou a política, mas a voz já não é a mesma e os covers parecem que caíram de vez nas graças desse baiano. Bom, conta contra ele também o fato de ser o pai de Preta. Simplesmente, não dá...


Como bom amante do indie rock que sou, fiquei vidrado com a nova fase de Caê. A banda é redonda e as duas últimas turnês, de "Cê" e "Zii e Zie" (essa última ainda no início), ficam marcadas com shows intensos, que cheiram a sangue, suor e sexo. É rock ou não é? Pouco importa. Se o novo disco "Zii e Zie" é inferior ao seu irmão mais velho "Cê", ao menos o show manteve o patamar de excelência. Repertório pouco óbvio, versões viscerais de antigos clássicos e um Caetano com vontade imensa de cantar.


Simbólica é a interpretação de "Eu sou neguinha", quando Caetano solta a franga, sem medo de mostrar que é de uma geração que não prioriza nem o preto, nem o branco, mas sim o cinza. Deixando os meninos Pedro Sá, Marcelo Callado e Ricardo Dias Gomes solarem, ele demonstra que os anos que carrega nas costas o deixaram mais generoso. Uma coisa é certa: a separação da chata Paula Lavigne fez um bem danado a esse grisalho santamarense.


Em tempo: nos cinemas, vale a pena conferir o documentário "Coração Vagabundo", gravado em meio a turnê de "A Foreign Sound".

A cidade do sol


A luminosidade de Salvador é algo que não se explica. Só sentindo para entender. Com um índice de 80%, só perde para Atenas, a cidade grega que leva o título mundial de iluminação natural. Bom, pelo menos não torramos a 40 graus como eles por lá... No dia-a-dia, essa luz gritante vira rotina e a disfarçamos com óculos escuros ou algo que o valha. Mas basta morar longe da velha Bahia e dar somente eventuais pulos na sua terra para valorizar o que há de especial nesse clarão.


Dispense os óculos escuros e curta Salvador como ela é, com sua cores gritantes, seus contrastes e o mar azul. Há algo mais impressionante que a descida da Avenida Contorno em um dia de luz intensa? Rivaliza com qualquer outra paisagem do mundo. Sabe do que mais? Definitivamente, mais que a praia que a Paulicéia Desvairada não me oferece, sinto falta mesmo é da luminosidade da bela São Salvador.

domingo, 12 de julho de 2009

Uma nova vida


Confesso: sofro por antecipação. Os dias que precedem uma mudança, mesmo não tão radical, são de uma eterna dúvida na minha cabeça. Será que vai dar certo? Fiz a escolha adequada? Não seria melhor esperar mais um pouco? Uma mudança de cidade então, é quase um parto. Nos dois meses anteriores à minha mudança para São Paulo, diversos longas-metragens passaram na minha frente: como vou viver longe da minha família? E meus amigos? Quando tiver uma festa imperdível e eu não puder ir, segurarei a barra?

Bom, no lado profissional, a nova vida era inevitável. Já comecei a trabalhar na área de Comunicação Empresarial sabendo que a ida para São Paulo era questão de tempo. Foi mais rápido do que se esperava, mas no momento certo, num raro alinhamento dos astros. Não tinha do que reclamar.

Como sempre acontece, desde os dois intercâmbios que fiz para os Estados Unidos e Espanha até essa mudança sem data para voltar, o fim da tormenta se dá no exato momento que piso na nova vida. Como um clique, a cabeça aprende a chamar aquela nova realidade como sua e a adaptação é rápida e sem grandes sofrimentos. Será que nasci para ser nômade? Se sim, assim serei, mesmo que não esquecendo que minhas raízes ficarão sempre a alguns quilômetros de distância, na minha cara Salvador. Para lá sempre retornarei, mesmo que por curtos e bem vividos dias.