domingo, 27 de fevereiro de 2011

O lamento do fim



Enquanto temos que ficar ouvindo baboseiras sem tamanho sobre a nova banda de Liam Gallagher (who cares?) e histeria só porque o Strokes lancou disco novo, algumas das bandas mais bacanas do planeta encerram as atividades. Primeiro foi a White Stripes, cuja música marcou um bom tempo da minha juventude. Amparada no talento genial de Jack White e trazendo uma baterista que mais fazia charminho que qualquer coisa, o White Stripes só lançou discos bons e fez shows marcantes no Brasil. Só tive oportunidade de ir a um, no Tim Festival de 2003. O consolo é que Jack White ainda está envolvido com dois ótimos projetos, o Racounters e o Dead Weather. Virtuoso e sujo na sua guitarra, já está na hora de Jack voltar ao Brasil. E não será surpreendente se ele montar um terceiro projeto para substituir o White Stripes. Workaholic por natureza, tem criatividade suficiente para administrar três projetos com propostas e sonoridades distintas.

Uma outra grande perda foi o encerramento das atividades do LCD Soundsystem. Anunciada desde que o terceiro disco foi lançado, ainda existia uma ponta de esperança que fosse apenas lorota de seu líder, James Murphy. Esperto, ele termina um projeto na auge da forma, provavelmente pensando em montar uma outra banda. Acaba o LCD sem resquícios de brigas, sem indício de perda de qualidade e com a certeza que deixará saudade em muitos fãs. Com seu rock encharcado de eletrônica, o LCD Soundsystem foi um dos grupos mais criativos dos anos 2000 e liderou um movimento que tem ainda outros expoentes como Hot Chip e Caribou. Para este que vos fala, ficou o privilégio de vê-los pela segunda vez ao vivo (a primeira foi no Skol Beats, em 2006), em São Paulo. Um dos últimos shows da banda, que agora faz uma temporada de despedida em Nova Iorque. Amparado por uma banda da melhor qualidade, James Murphy fez a platéia da Warehouse se balançar por todo o tempo, com uma música vibrante, performance matadora e repertório equilibrado - um greatest hits dos três discos. Com uma cara de nerd que tenta em vão esconder a sua genialidade como músico, James Murphy é a cara da música contemporânea. Só espero que não passe muito tempo nas suas merecidas férias.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

A arte de servir bem



Eu já gostava muito de comer em restaurantes, mas a minha mudança para São Paulo só potencializou esse costume. Aqui não tenho a comidinha caseira da mamãe e a oferta é tentadora demais. Mantenho uma lista com dezenas de restaurantes a visitar, na realidade apenas um extrato de todos que queria conhecer. Afinal, é impossível visitarr tudo: primeiro porque é caro, segundo porque toda semana aparecem novidades. Isso fora o fato de que algumas ótimas casas não chegam à fama; só garimpando mesmo para descobrir. Parcimônia nesse caso é ótimo para o bolso e para o peso. Todo cuidado é pouco para não engordar e empobrecer nesse mundo de delícias.

Se aqui em São Paulo eu descobri alguns dos meus restaurantes favoritos, também tive algumas experiências maravilhosas no exterior. No topo da lista está o Peru, país com culinária cheia de personalidade e invariavelmente boa. Tem que pesquisar muito para comer mal em Lima. Portugal, Espanha, New Orleans... Comi bem em todos esses lugares e em muitos outros. Mas foi em um restaurante de Buenos Aires que tive uma das melhores experiências gastronômicas. Situado em um dos bairros mais turísticos da cidade, Puerto Madero, o restaurante Chila é um exemplo de programa completo. Serviço impecável, recheado de gentilezas; ótima comida; ambiente refinado, com bela vista; e preço justíssimo, quando comparado aos valores exagerados praticados em São Paulo. Não à toa, foi escolhido como o melhor restaurante argentino de 2008 e sua chef, Maria Soledad Nardelli, conquistou em 2010 o prêmio "Chef del Futuro", entregue em Paris.

O que faz do Chila um restaurante tão especial? Para começar, parece que você é atendido não por um garçom comum, mas sim por um dos donos da casa. A sensação é que fecharam o restaurante para você e o dono se dispõe a explicar detalhadamente tudo que você quer saber, dando 100% de atenção. A segurança, fluidez e simpatia dos atendentes parecem inspirados em um três estrelas do Michelin (não, nunca fui a um mega estrelado do Michelin, isso é tudo suposição). O tratamento é tão vip que todos os clientes recebem "brindes" especiais da chef. Na minha vez, recebi uma entrada, um espumante gentilmente oferecido para acompanhar as ostras que pedi como aperitivo e uma sobremesa. Isso fora a bandeja com vários chocolates espetaculares que vêm junto com o café. Tudo elaborado com esmero, assim como os pães feitos no próprio restaurante e os pratos muito bem apresentados e deliciosos. Comida contemporânea da melhor qualidade. E melhor: bem servido. Não estou falando de prato de peão, não me entendam mal, mas simplesmente não admito pagar caro e sair com fome. Isso para mim não é elegância, mas sim metidez ao extremo. Comer bem e ficar satisfeito, quer algo melhor? Outro ponto a favor do Chila é que os garçons têm opinião para tudo. Não se metem se não são chamados, mas aconselham os clientes com precisão se indagados. Está em dúvida entre dois pratos? O seu chef particular vai opinar com argumentos diretos, quase técnicos, que você interpreta de acordo com os seus desejos. Feito na medida para parecer exclusivo. Não tenho dúvida que na minha próxima ida a Buenos Aires, o Chila será parada obrigatória!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Casarão de memórias


Morar fora da cidade natal, faz com que a pessoa precise se desgarrar mais das coisas materiais e não deixar a melancolia bater. Sei que isso vale para todos, em maior ou menor intensidade, mas creio que morando longe de casa, soma-se a isso a sensação de impotência. Por todos os anos de minha infância e adolescência, Portão foi a minha referência de refúgio, de casa para curtir a família e de festas inesquecíveis. Sinônimo de lazer, junto com a Praia do Forte (que jé foi motivo de post por aqui). Agora o sítio (antes fazenda) está com os dias contados. Acabando o mês de março, não pertence mais a Família Bala. A quantidade exorbitante de condomínios que surgiram na região tiraram a paz de Portão, local que íamos para descansar ou para celebrar sem correr riscos. Virou cidade, acabou a privacidade e até mesmo a segurança. A modernidade chegou; não houve escolha. Assim vai embora uma das minhas últimas referências palpáveis da infância. Um dos últimos locais onde podia ir e lembrar de situações da minha mais tenra idade. Cada pequeno espaço daquela casa centenária é recordação de um momento. Ali cresci e aprendi a valorizar o que há de mais importante na vida: a família.

Casa agregadora, com nove grandes quartos, próxima de Salvador, Portão era a sede de uma fazenda que eu não conheci. Não há dúvida que marcou todos os Balas, além de muitos dos amigos que ali estiveram. Casa que viu muitos casamentos (de tios queridos, primos e meu irmão), minha formatura, despedidas e boas-vindas dos meus intercâmbios, inúmeros aniversários, festas de São João e uma festa aberta ao público que deixou marca na história de Salvador. Sem exagero. A Festinha em Quadrinhos durou uma década, reuniu até 2 mil pessoas por noite e ainda hoje é lembrada. Para mim, era ainda mais especial, pois lá chegava bem antes da festa oficial começar e só ia embora muitas horas depois, tendo o privilégio de dormir no casarão.

Mas morando em outra cidade, tenho mesmo é que me conformar. Afinal, nas minhas idas a Salvador, o tempo é curto e as idas a Portão se tornaram praticamente impraticáveis. Acabariam se tornando esporádicas, de qualquer modo. Porém seria bom saber que Portão está logo ali, não? Vão restar as lembranças boas. A saudade dos parentes que se foram e que aproveitaram longas temporadas no casarão; os lautos almoços precedidos por intermináveis tira-gostos e sucedidos pela soneca de muitos; os empilhados engradados de cerveja, que marcaram minha entrada no mundo etílico; as dormidas nos quartos das crianças; os longos banhos de piscina; a sala de televisão recheada de conversas e mais alguns cochilos. Fica tudo isso guardado na memória e registrado em inúmeras fotos que certamente verão algumas lágrimas caírem.