quinta-feira, 7 de junho de 2012
O vício da vez
Sou noveleiro sim, e dai? Mas confesso que andava de saco cheio das novelas das 9 repetitivas da Globo (as únicas que posso e que quero ver). Estava aproveitando o precioso tempo para ler livros, ver filmes ou qualquer coisa que o valha. De vez em quando parava para dar uma olhada na novela da ocasião, mas raramente a narrativa me pegava.
Mas eis que o autor de uma das únicas exceções recentes, "A Favorita", volta a cena. Resolvi apostar em João Emanuel Carneiro novamente e não errei. Ainda melhor que "A Favorita", "Avenida Brasil" é viciante. Fugindo do padrão, praticamente todos os capítulos da trama trazem informações importantes e cenas impactantes. É o extremo oposto das modorrentas novelas de Manoel Carlos, por exemplo. Na esperança de ser um retrato da vida como ela é, o autor que tem fixação nas "Helenas" mata o telespectador do tédio. Quem quer vida real não precisa de novela, basta abrir a janela de casa. Os outros autores da velha guarda pecam pelos mais diversos motivos, com destaque para o sempre acima do tom Aguinaldo Silva e a chatíssima Gloria Perez, na minha opinião a pior de todas.
"Avenida Brasil" já acerta de cara ao reduzir o elenco, longe da multidão que se tornou moda dos anos 90 para cá. Os núcleos são poucos e bem dinâmicos. Os atores novos sempre surgem na trama para revelar algo muito importante, como é o caso da recente entrada em cena de Cláudia Assumpção, interpretando Neide. A opção de João Emanuel de retratar a classe C se mostra acertadíssima, pincelando com uma leve caricatura as características dessa classe que ainda está em formação e vem sendo desvendada pelas empresas de entretenimento e consumo. Ao incluir dois personagens gays na trama, o autor faz de um um jogador de futebol algo sensível e do outro uma figura tatuada, que adora assistir futebol e cerveja. Foge totalmente dos estereótipos de Aguinaldo Silva, por exemplo.
Uma forte característica de João Emanuel é a maneira como ele lida com vilões e heróis. Fugindo de um maniqueísmo que seria mais facilmente absorvido pelo público, ele investe em personagens que podem ser bons ou maus e não são somente um dos dois. Em determinado momento da trama - isso aconteceu em "A Favorita" também - fica difícil dizer quem merece a confiança do espectador. E, pode ter certeza, a heroína vai utilizar os artifícios mais antiéticos para alcançar os seus objetivos. Nada melhor do que essa zona cinza que o autor propõe, fugindo do preto e do branco excludentes que não correspondem à realidade. Falando em cores, a fotografia é um caso à parte na novela, mostrando um cuidado que antes a Globo só dedicava às minisséries.
Por fim, um dos maiores méritos desta novela - e aí é necessário dar crédito também a equipe de diretores - seja o afiado elenco. Todos os atores estão bem e encarnam seus papéis com muita propriedade. Destaque para Adriana Esteves, que faz de Carminha uma vilã complexa e dá um show nas expressões faciais e nas cenas mais emotivas. Confesso que nunca gostei de Adriana, mas em "Avenida Brasil" ela ganhou um fã. Outro que só andava fazendo papéis fracos era Murilo Benício. No papel de Tufão, ele é o próprio emergente que subiu na vida por conta do futebol, sem nunca perder a sua personalidade. Pode ter todo o dinheiro do mundo, mas nunca deixará de ser uma pessoa simples, que não segue as regras de etiqueta e tem pouca cultura. Seus pais, encarnados por Marcos Caruso e Eliane Giardini, completam as ótimas atuações do núcleo de Carminha e Tufão. Passaria o dia inteiro destacando outros bons atores, mas não poderia deixar de fora Cadinho/Dudu (Alexandre Borges) e uma de suas mulheres, a Veronica de Deborah Block. Já Suelen (Ísis Valverde) é responsável por algumas das boas risadas da trama. Mesmo não sendo destaque absoluto, o casal protagonista Nina (Débora Falabella) e Jorginho (Cauã Reymond) tampouco compromete. Um elenco afiado que garante que a novela não vai desandar até o final. Até lá, o vício permanece!
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